A nutrição nas fases iniciais da vida é um fator que contribui para o crescimento alarmante da obesidade infanto-juvenil. A obesidade precoce está diretamente relacionada com o desenvolvimento de outras doenças crônicas associadas, como o diabetes tipo 2, doenças hepáticas, hipertensão e doenças cardíacas, que podem se agravar precocemente e perdurar por toda a vida.
Isso ocorre por que o organismo jovem possui uma alta predisposição a altear sua fisiologia em resposta a diferentes estímulos como uma resposta adaptativa. Através de alterações epigenéticas (quando as células mudam o padrão de expressão gênica) os tecidos podem mudar seu metabolismo e ser programado para o desenvolvimento de uma disfunção na idade adulta. No entanto, apesar das alterações epigenéticas serem estáveis, elas são potencialmente reversíveis, tornando importante a busca por tratamentos capazes de reprogramar as alterações induzidas pela obesidade precoce.
A canela é uma das especiarias mais consumidas no mundo com diversos efeitos benéficos quanto à melhora do diabetes tipo 2 e da obesidade, efeitos mediados em grande parte pelo cinamaldeído, principal componente do óleo essencial da canela (~90%).
Devido ao potencial anti-obesogênico e anti-diabetogênico do cinamaldeído, desenvolvemos um projeto para estudar a capacidade do cinamaldeído para tratar a obesidade infato-juvenil e reverter as possíveis alterações epigenéticas induzidas pela obesidade precoce, prevenido assim o desenvolvimento de doenças crônicas associadas no longo prazo.
Usamos o modelo de superalimentação em ratos, feito a partir da redução da ninhada para 3 animais por mãe (dessa forma os filhotes mamam mais e desenvolvem obesidade precoce). Um grupo controle foi mantido com 10 filhotes por mãe. Fizemos o tratamento com cinamaldeído (40mg/Kg de massa corporal/dia) durante a fase da adolescência, ainda considerado uma janela de programação (passível de modificações epigenéticas e reprogramação do metabolismo).
Aos 60 dias, logo após o fim do tratamento, o cinamaldeído promoveu redução do tecido adiposo (especializado no armazenamento da gordura) e dos lipídios circulantes, além de atenuar à resistência à insulina, importante marcador do desenvolvimento do diabetes tipo 2. A redução do tecido adiposo foi associado a redução de síntese de lipídeos e estimulação da ativação do tecido adiposo marrom (tecido especializado na produção de calor através da termogênese).
Quando avaliamos os animais aos 180 dias (4 meses após o fim do tratamento), os ratos que foram tratados com cinamaldeído apresentaram normalização da adiposidade visceral, e redução do acúmulo de gordura no tecido adiposo marrom, atenuação dos lipídeos circulantes e do conteúdo de lipídeos hepáticos, com redução de marcadores de síntese lipídica no fígado, tecido adiposo branco e marrom.
O presente estudo mostrou que o tratamento com cinamaldeído tem efeitos benéficos no curto e longo prazo. Nossos dados destacam que a fase adolescente é uma janela importante para a intervenção das disfunções metabólicas infanto-juvenis, e o cinamaldeído pode ser um aliado no tratamento da obesidade precoce.
Este estudo fez parte do projeto de doutorado da aluna Jessika Geisebel Oliveira Neto, do programa de Pós-Graduação em Ciências Biomédicas da UFF.